1.5.10

Da urgência do teatro: Blackbird



Ray- Eu estou a viver a minha vida.
          Uma vida nova pela qual lutei porque perdi

Una- Alguma vez pensaste em mim?

Ray- Tenho todo o direito de afastar tudo da minha cabeça o mais que puder.

Una- No que se estava a passar comigo?

Ray- Tu achas que eu deveria reviver o que se passou todos os dias?
          Isto é a minha vida.
          Tu não podes

(...)


Una- Mas magoaste

Ele estende o braço e faz-lhe uma festa.    

Ray- Tu estavas sozinha.
         Antes de me conheceres.
         Quando me conheceste.
         Tu estavas só.
         Eras uma criança solitária.
         Os teus pais deixavam-te por tua conta.
         Tu nunca o disseste mas quando eu te tinha nos meus braços eu conseguia sentir.
         Agora percebo.
         Eu pensava que eras forte.
         Mas não és.
         Eu também não sou.

Eles beijam-se.


Ray- Eu pensei em ti.
         Ainda penso em ti.

Una- Pensas em quê?
         Pensas em mim naquela altura?

Ray- Sim.
         Penso.
         É tudo o que tenho.

Una- Naquele quarto?

Ray- Sim.
         A tocar-te.
         A abraçar-te.

Una- A foder-me?

Ray- Sim.
         A foder-te.

Una- Masturbas-te?
          Vens-te?

Ray- Sim.

Eles beijam-se.
Vai ficando mais intenso.
Começam a despir-se um ao outro.
Deitam-se no chão.
Ray afasta-se.

Ray- Não. Eu não posso.
         Eu não posso.

excerto de Blackbird de David Harrower, tradução de Tiago Guedes.
a fotografia é da mesma peça encenada por David R. Gammons.

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