18.3.12

Meia flor de boca morna


É possível que os ramos se tenham tornado espessos demais. Que enquanto toca no seio direito, leve à boca o sabor de um amargo caule das silvas. Mas das pedras mártires da noite, sobram selvagens e negros os coitos interrompidos por acidentes automóveis. Onde atar-lhe o corpo não lhe é suficiente para abafar o choque e o ramo entre as pernas não lhe segura o desejo. Onde o corpo se cheira a flores de uma tristeza Maria. Mas é o cheiro do alcatrão numa noite sem mais seios, é o cheiro de um doce sofrido. O cheiro do movimento perpétuo. Aliás, pela primeira vez entendemos que o corpo sofre; o corpo não, os pés, as pernas, a cara, o pescoço, o tronco e as mãos. E fazem coisas horríveis, que o corpo diz muito mais que uma mentira. Que o corpo é um tal nervo de duras e imprecisas reacções que não o controlamos nem a interruptores de luz. Se eu pudesse, teria corrido a atar-te o corpo. Impedir-te-ia de te mostrares. Seriam as folhas de Carvalho a impedir-te a boca. Uma meia boca morna de violência ganha. Não foi pelo contrato que assumimos, foi pelas flores que comemos.

(fotografia de Marija Kovač)
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2 comentários:

matrioshka disse...

sem ar.

Annie disse...

E eu não tinha a quem o dedicar. Dedico-to.
"Com pétalas de rosas, para a M."